Rodou, rodou e rodou. Três voltas cuidadosas, os dedos a apertarem o toco de pau, carinhosamente, era o que sobrara do que tinha sido um elegante e comprido lápis. Afinal um simples lápis de escrever desses que quando ainda existia o hábito de o fazer à unha se sossegava atrás da orelha para não se perder o tino do lugar, era coisa de homem feito com profissão, aliás fazia-se o mesmo com os cigarros, era para gente grande, está-se a ver. Agora restava-lhe um pedacinho, curto, nem dava para afiar no canivete por isso apontou-o ao afia e rodou por três vezes.
Era o sobrevivente de meia-dúzia. Dos outros nem o rasto, por isso a esta sobra reservava escritos de importância, coisa grande.
Pigarreou, olhou a folha branca e a sombra alongada pelo lápis curto e poupado que a luz do candeeiro projectava.
Assentou o bico na folha, fez pressão e recordou-se da conversa sobre o gosto dos lápis, a escrita com lápis, há quanto tempo tinha sido e os anos a passarem e eles a escreverem sobre mares e rios e à espera de palavras a lápis que no fundo eram macias como a escrita feita destes mas tão mais semelhantes à pele das mãos quando se escapa na queda e estão lá para se agarrarem com calor, som do estalo a colarem-se uma na outra, vida a chamar vida, uma contínua corrente que prende o navio e não o deixa à deriva, assim tinham sido as palavras de anos nas cartas trocadas. Era mais que um gosto ou uma companhia esperada, era a confiança da confidência, o conselho sem a condenação do juízo.
Um ponto.
Levantou o lápis. Sorriu e escreveu: Desta vez fica por minha conta, mando eu a meia-dúzia.
E dobrou junto o que restava apertado nos seus dedos na folha de carta a enviar.
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