Lá andava ele. Nunca fez mal a ninguém. Bem também não.
Mas por uma qualquer razão toda a gente diz para não se aproximarem dele, especialmente às crianças, muito cuidado, é de fugir e de não deixar chegar perto e vir logo contar se ele chamar ou quiser oferecer alguma coisa, embora de seu nem a roupa que é mais buraco que o descobre na pele suja do que o aquece quando chega a invernia. Mas isto nunca se sabe, há quanto tempo vive este diabo por aqui, logo no adro da igreja, a culpa é do padre que lhe dá sopa e da cambada que sai da taberna defronte e o desafia para os copos.
Lá anda ele. Sempre anima, que isto é uma risota vê-lo a falar com as árvores e as bicicletas arrumadas. E uma tristeza, que olhando melhor é capaz de ser um homem novo. Ou talvez não, ninguém sabe, aquela barba não deixa adivinhar nada, só o fado triste pendurado nos beiços que até dá pena ouvi-lo quando se está em casa. É bonito. Tudo silencioso e só aquela música a ouvir-se ao longe, onde será que ouviu aquilo, é quando está pior que se põe a assobiar aquilo e depois está dias que ninguém o vê. Já se deu como morto várias vezes mas o demónio tem sete vidas, aparece rotinho e mais doido do que se foi. Ninguém sabe donde veio nem como se chama ao certo, qualquer coisa lhe chamam e o tolo ri-se e o povo acha graça. Agora que leva jeito para os bichos isso é verdade, mas deve ser do cheiro, que as bestas sempre se juntam umas às outras e é vê-lo com a canzoada de volta dele até chegar o padreco e espantar o adro fora até todos levarem sumiço. Não gosta, que vai-se mas de braços ao alto como se a fúria o tomasse, mas não tem outro remédio que a mão que o castiga é a mão que o alimenta.
Coitado.
Parece que ainda o estou a ver.
Lá andava ele. Quem diría que era gente de bem e ficou assim maluquinho.
Ainda o tentei ajudar. Assobiava tão bem.
Há-de estar num lugar melhor.
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